domingo, 15 de julho de 2012

Angola * Serviço de Correio da Diamang


            Em Junho de 2001 publiquei um artigo intitulado História Postal de Angola (9) * Estação Postal do Dundo, no Boletim do Clube Filatélico de Portugal n.º 392, através do qual procurei historiar sobre o nascimento e vida daquela estação postal. O que ali escrevi mantêm-se actual, porém agora venho acrescentar algo mais sobre a história do serviço postal na área de influência da Diamang.
            Como naquela data escrevi, em consequência da descoberta de campos diamantíferos no ex-Congo Belga, pela Société Internacionale Forestière et Minière du Congo, ao longo do leito do Rio Cassai e seus afluentes, fundou-se em 12 de Setembro de 1912 a Companhia de Pesquisas Mineiras de Angola (PEMA), com o objectivo de averiguar sobre a existência ao não de diamantes, na parte hidrográfica pertencente a Angola e contínua aos vários tributários do Rio Cassai.
            A Companhia tinha como sócios fundadores o Banco Nacional Ultramarino e a firma Henry Burnay & Cia (mais tarde denominada Banco Burnay) de Portugal, a Société Général de Belgique e a Mutualité Coloniale da Bélgica, o Banque de l´Union Parisienne da França e o grupo Ryan-Guggenheim dos E.U.A.. Em 1913 impulsionada pelo General Paiva de Andrade e Dr. Baltazar Cabral obteve a Companhia uma concessão legal para fazer pesquisas na Lunda. Os trabalhos de pesquisa seguiram em bom ritmo com o apoio da congénere belga, sendo as perspectivas tão boas, que permitiram comprovar a existência de um rico campo diamantifero na Lunda, o que levou em 1917 à constituição da DIAMANG - Companhia de Diamantes de Angola, filial da Companhia de Pesquisas Mineiras de Angola, destinada à exploração.
Vagonetes para o transporte do minério
            Em 1920 foi negociado um contrato de exploração entre a Diamang e o Estado, pelo qual, aquela ficava com o direito por tempo indefinido às minas descobertas e de todas aquelas que demarcasse até ao ano de 1951, enquanto que ao Estado eram oferecidos 5% do capital social desta empresa, e o direito a receber 40% dos lucros líquidos que ela gerasse. Posteriormente, em 1954, foi renegociado o contrato anterior, passando o Governo da Província de Angola a ter direito a 50% dos lucros líquidos.          
            A Diamang vai dinamizar todo o nordeste de Angola, e a sua obra é impar em todos os seus aspectos, mas principalmente dela resultam grandes benefícios quer na economia quer na ocupação nacional da Província. O que foi feito na Lunda, sob todos os pontos de vista, é uma obra de larga visão e projecção socio-económica na vida de Angola.
            Porém a Diamang vai exercer um controlo quase que discricionário sobre a região abrangida pelo contrato firmado com as autoridades portuguesas. O Dundo e Vila Paiva de Andrada constituíam os dois maiores núcleos populacionais do nordeste da Lunda. A população residente era constituída quase na sua totalidade por empregados da Diamang, de tal forma que por Portaria n.º 753 de 9 de Abril de 1931, o então Governador-Geral de Angola, José Dionísio Carneiro de Sousa e Faro manda eliminar aquelas duas povoações do “Mapa das povoações existentes e sua classificação”, devendo os seus terrenos ficarem integrados nas concessões de terrenos, feitas à Companhia de Diamantes de Angola. Alegava-se que ambas eram povoações de natureza particular.
Portaria n.º 753
            Tanto assim é, que a estação postal e telegráfica do Dundo foi montada pela Diamang e a generalidade do seu movimento tinha como origem o serviço da Diamang e dos seus trabalhadores.
            Há muito tempo que tinha uma quase certeza de que deveria existir um serviço postal instalado pela Diamang nos territórios a si concessionados, porém tendo em conta os regulamentos postais que determinavam ser o serviço postal um monopólio do Estado, tinha uma certa relutância em admitir a existência desse serviço postal particular.
Vista aérea do Dundo
            Porém, há cerca de um ano, tive a rara oportunidade de adquirir, num leilão da Ebay, uma espectacular carta que veio confirmar as minhas suspeitas.
            A carta (Fig.1), franquiada com selo de 1F75, é remetida por via aérea da Bélgica * Hoirefontaine (22.08.1941) para o Dundo com trânsito por Elizabethville (12.09.1941) e Tshikapa (15.09.41). Foi censurada pelos alemães e depois pela censura belga em Elizabethville. Provavelmente, sendo o destinatário Emile Gratia, funcionário da Diamang e não se encontrando nesse momento no Dundo a carta foi remetida sucessivamente pelos serviços de correio da Diamang para Maludi (20.09.41) e para Andrada (Vila Paiva) (22.09.1941).
Figura 1
            Os dois carimbos têm a mesma morfologia e são compostos por três rectângulos agregados formando um outro rectângulo medindo 38mmx26mm.
            Foi um carimbo desta tipologia que durante os anos de 1935 a 1936 serviu como marca obliteradora na estação postal do Dundo conforme se pode ver pela carta da figura 2. Para não ser muito chocante a utilização da marca original encimada pela palavra DIAMANG numa estação postal, que se presumia ser estatal, esta foi limada. O carimbo mede 38mmx17,5mm exactamente a mesma medida dos dois rectângulos inferiores dos carimbos de MALUDI e ANDRADA.
Mapa
            Estranha-se o facto de a carta não ter sido obliterada com o carimbo da estação receptora (DUNDO). Será que de Tshikapa as cartas eram enviadas directamente para a Diamang? É uma hipótese!!!...
             Esta última (Fig. 2) carta tem sido para mim uma incógnita. Foi remetida registada por via aérea do Dundo (14.09.35) para Bruxelas, com trânsito por Tshikapa (16.09.35), Luluabourg (19.09.35), Port-Franqui (21.09.35) e Conquilhatville (22.09.35), onde apanhou a ligação aérea da Sabena para Bruxelas via Stanleyville. Pagou de porte 24$05. Conhecendo-se o peso da carta (38gr manuscrito no canto superior esquerdo) podemos desde logo tentar decompor o porte: 1$75 pelo 1.º porte do correio ordinário (até 20 gr) + 1$00 pelo segundo porte (21 a 40 gr) + 2$00 pelo prémio de registo, restando 19$30 para o porte aéreo.
Figura 2
            Pelas tarifas conhecidas do correio aéreo a cada 5gr corresponde um porte, assim esta carta teria de pagar uma franquia correspondente ao 8.º porte. Nesta data Angola ainda não tinha tabelas para correio aéreo aprovadas e em execução. A primeira tabela de correio aéreo foi publicada em 24 de Junho de 1936. Por que tabela, ou por que critério foi franquiada esta carta? Por agora não consigo interpretá-la. Pode ser que o tempo se encarregue de deslindar esta incógnita. Por ora fico a aguardar que apareça alguma legislação que justifique esta franquia.
            Atendendo à falta de regulamentação sobre o trânsito de correspondências por via aérea, durante anos foi norma na estação postal do Dundo a opção pela franquia mista, quando se pretendia fazer seguir as cartas por essa via. Aproveitando o preceituado na alínea c) do parágrafo 1.º do Art.º 3.º do Regulamento dos Correios Ultramarinos de 11 de Dezembro de 1902, que permitia o transporte por particulares de cartas, cartões postais, bilhetes postais e processos judiciais que já tenham sido franqueados e carimbados nas estações postais do lugar de procedência, os objectos postais eram apresentados franquiados na estação postal do Dundo, de acordo com as tabelas de porte em vigor, obliteradas e entregues ao portador para seguirem em mão. Eram transportadas até ao Tshikapa, a cargo da Diamang que facultava uma carrinha para esse efeito, onde eram apresentadas nos correios belgas para seguirem por via aérea, pagando-se o porte devido pelo serviço. É certo que as cartas estavam sujeitas a uma aumento significativo do porte, porém tinham como vantagem poderem seguir num meio de transporte mais rápido, ganhando-se uma vantagem significativa em relação ao meio de transporte tradicional (via terrestre e marítima).
Figura 3
            Na figura 3 apresentamos um exemplo desta forma de circulação de correspondências. A carta foi remetida do Dundo (07.02.31) para Leopoldville (16.02.31) com trânsito por Tshikapa (13.02.31). Pagou no território português a franquia de 1$40 (1.º porte do correio ordinário para o estrangeiro * cartas com peso até 20 gr * Decreto 18.467 de 16.06.1930). No Congo Belga foi franquiada com 1$50 (1.º porte da sobretaxa do correio aéreo).
            A estação postal do Dundo, provavelmente por ser quase que uma estação particular, esteve durante muitos anos privada de um carimbo próprio para obliteração das correspondências. Conhecem-se várias marcas provisórias e de recurso. A utilização de um datador como marca obliteradora, foi uma das utilizadas durante um largo período.


Bibliografia
·         Boletim Oficial de Angola
·         Correia (2001) – Boletim CFP 392 Junho 2001
·         Eduard Proud (2010) – Intercontinental Airmails, Volume Three, África
·         Roger Gallant (2005) – Histoire du Service Postal au Congo Belge (1886-1960), Tome I


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